domingo, 11 de março de 2012

'Sofrer de poesias'

Venenos e Deus, remédios do Diabo. M. Couto.

Mia Couto está sobre minha cama, no criado mudo – agora comovido. Figura em pé, na prateira a fitar-me tranqüilo. Está em casa. Ele é o tipo de escritor que parece surgir das páginas mansamente. Dá para ouvir dentro do peito sua fala envolvente. Seu texto tem a habilidade de conversar com o leitor quando esse se põe a ouvir sua voz macia.

Ele conduz, sem cerimônia ou convite, cada um que se aventura na sua linguagem pelas paragens africanas. Não aceita nosso exitação. Não aceita recusa. Não ouve elucubrações frias e racionais. Seu universo é maior e transborda, inunda o ar da leitura de leitosa amorosidade. O tempo perde a métrica, não há mais cronos ou suas algemas: somos nós invadidos pela África moçambicana que esse seu dileto filho pinta com as cores amareladas do esquecimento. O sol inclemente da sua escrita curva a fronte da mais altiva soberba dos entendidos.

Quem lê se rende, quem ouve se africaniza. Adoça a vida com o som da própria terra: com o choro dessa mãe que a tudo espreita e testemunha, porque viu a morte fecundar o campo estéril de medo e de memória. A morte que converteu aquele chão em África e que a história construída em gabinetes insípidos tenta contar e contar uma vez mais depois de passada a limpo.

A lembrança indômita, esparramada pela vastidão da humanidade, não é clareada pela escrita, porque o vivido mora no fundo de cada expressão amaciada por outra língua. As palavras são indícios que não chegam a comportar o agreste, o gosto suado, nem mesmo o peso da lágrima chorada pelo rio da tristeza. Ele canta o conto para por ritmo ao signo, liberta o sentido.

Não é narrativa da vida - é sonho que vive.

Ao fim do seu texto saímos procurando a Moçambique do mapa, porque Mia já mostrou onde ela se situa dentro de nós. Sem perceber ficamos doentes, afetados irremediavelmente de uma doença que nos faz querer comunicar na linguagem da alma. Estamos sofridos de poesia: língua, pátria, porto, pedra.

Rompendo a greve

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9 Comentários:

Anonymous Doroteia disse...

Fura-greve!

11.3.12  
Blogger Dna. Bona disse...

Humpf. Voto a favor de retaliações. mas... afinal, qual é a nossa lista de requisições?

12.3.12  
Blogger Inara Rodrigues disse...

Lindo texto! É assim que sinto/leio também o Mia Couto - "Não é narrativa da vida - é sonho que vive"- muito bom!

12.3.12  
Anonymous Doroteia disse...

Dona Bona, as divinas se escafederam, sumiram do serviço e nem tchuns e a patroa mandou botar a placa, tendeu?

13.3.12  
Blogger Dna. Bona disse...

Bah, essa patroa precisa alargar o pensamento. Somos uma cooperativa que trabalha motivada pelos insights criativos. De obrigação a vida já está cheia, não?
Ô patroa, reconsidera aí, vai!

13.3.12  
Anonymous A patroa disse...

O problema é que o bloqueio é coletivo!!! NAda funfa!

14.3.12  
Blogger Marina disse...

Oi gente! Voltando de férias e com saudades do blog...como ficamos?

2.4.12  
Anonymous Tássia Novaes disse...

Paula, me deu vontade de ler o livro. Assim como vc, gosto muito do autor. E sobre a greve, acho que fui a primeira a saltar fora, mas agora me deu vontade de voltar. Pode?

11.7.12  
Anonymous Doroteia disse...

Uia!!! Vamos trabalhar meninas!!!

11.7.12  

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